No princípio era o verbo. E logo a necessidade de sujeitos de suas ações. E depois adjetivos para qualificá-los. E pronomes para chamá-los. E já não era só o verbo. Nem princípio. Era já um mundo, o universo. Por que o mundo não chama univerbo se no princípio era o verbo? No princípio era o verso, pois já era intrínseca a fome de encantamento de tantos sujeitos.
24 de jul. de 2007
I LOVE SAMPA
18 de jul. de 2007
MENINO-TATU
Menino-barriga, menino-robô
Menino-sem-graça, menino-cansado
Menino-pele-de-sol-olhos-de-areia
Menino-bonito, menino-rotina
Menino-luta, menino-tábua-de-salvação
Menino-sim, menino-não
Menino-eu
Menino-solidão
JEITINHO BRASILEIRO
JEITINHO BRASILEIRO
Dignidade aviltada é corriqueiro
O que vale mesmo é o dinheiro
Não há o que não se consiga
Com o jeitinho brasileiro
No reino da esperteza
Favores, agrados, conchavos
São sinais da realeza
Qual o limite do que se admite?
Mentira, certo e errado
Quem é culpado?
Todo mundo é tão esperto
Lei de Gérson
Propina
Macunaíma
Nossa suprema idéia
De nação verde-amarela
Passa mais por Macabéa
Na vasta feira das facilidades
Gabaritos, lugares na fila
Negócios da China, pirataria
São tantos os patrocínios
(Patriocídios)
Pra cada rei tantos bobos da côrte
Babando o ovo e sorrindo sem dentes
Pra nossa paz aparente
Crentes que são espertos
ÁTONOS
ÁTONOS
Adoro os sons de ti
Os “ãs”, os “ons”
Os “us”, os “is”
Os “nãos”, os “sins”
Os átonos tonificados
Os graves em altos brados
Tons e sons bem temperados
Ai meu coração descompassado!
OLHOS E RESPIRAÇÃO
OLHOS E RESPIRAÇÃO
Chão sem chão
Sou olhos e respiração
Sem respiração
Sinto o ar escasso
Perto ou fora do seu abraço
Enquanto sonho com seu abraço
Sua imagem assim
Intensa
Desliza em mim
Imensa
Cheia de mãos
Vai logo tocando em tudo
Todo meu mundo
Mas no fundo é tudo não
Então
Ardo e respiro
Ou tento
E o ar que me falta se te vejo
É o mesmo que assopra meu desejo
17 de jul. de 2007
NÃO DEU
REVIDE
REVIDE
Aqui a violência
Está sempre de mãos dadas
Com as mãos atadas
De quem pode nada
Quem pode nada
Nada tem a perder
E, não o tendo,
Pode tudo
O que é absurdo?
Não dá o que te pedem
Não dá o que te excede
Não dá nada mas quer e de graça
Não planta mas colhe e se farta
E se quem vive na escassez
Cansou de esperar sua vez?
E se quem vive esquecido
Cansou de ser invisível?
E se viver à base da pancada
For revide pela existência ignorada?
CORAÇÃO NA BOCA
CORAÇÃO NA BOCA
A doçura do seu rosto
Me põe o coração na boca
A aflição não é pouca
Mas é boa
E a boca do estômago
Pula e me alcança a garganta
Mas sua doçura é tanta
Que faz carnaval no meu peito
E já nem sei se é o seu jeito
Ou o meu, de te enxergar
5 de jul. de 2007
PRA COMEÇAR
Resolvi ter um blog. Outro dia eu estava num show da Zélia Duncan, no teatro Rival, e meu chão tremeu. Bom, sempre treme, há dez anos vou aos shows dela e há dez anos meu chão treme. Mas desta vez derrubou uns tijolos e estou sendo obrigada a algumas desconstruções. Pra depois construir de novo. E o blog com isso?
Naquela noite ouvi coisas como "come on baby apostar na falta de exatidão" , "benditas coisas que eu não fiz... meus verdes ainda não maduros... os espaços que ainda procuro..." e "chega de tanta sala fechada, tanta fala calada, tanta água parada" . Eu já tinha ouvido, mas ouvir e ver, ao vivo, nesse exato momento da minha vida, derrubou os tijolos.
Não vou contar a estória da minha vida, mas questionei minha timidez, meu medo de me expor. Não seria a timidez uma vaidade? Por que tanta preocupação com o inevitável julgamento alheio sobre mim? O que pode acontecer de tão grave se eu mostrar meus sentimentos? Lembrei da raposa e as uvas, eu me vi nela e não gostei. Seria mais positivo ela buscar ajuda, pegar um banquinho, uma escada, e não matar o desejo pelas uvas só porque elas não estavam acessíveis. Posso cair da escada, mas quero as uvas ou não? Quanto eu as quero?
Vendo a Zélia naquela noite senti minhas uvas mudando de cor, saindo do verde para o vinho e me enchendo a boca d´água. Minhas uvas são tocar bateria e escrever. Em São Paulo eu tinha uma desculpa, trabalhava demais, não tinha tempo nem disposição, me sentia sufocada. Mas agora, aqui no Rio, trabalhando seis horas, sendo impregnada de natureza por todos os lados, a desculpa não cola mais. Está tudo tão mais leve que a desculpa começou a pesar na consciência. E aí veio a Zélia, mais uma vez.
Quanto ao banquinho, já tirei o pó dele e me sentei pra recomeçar a estudar bateria. Estou dando um jeito. Não é o que dizem, que quem quer fazer uma coisa encontra um jeito e quem não quer encontra uma desculpa?
Quanto à escada, é este blog. Aqui vou me dar ao luxo de escrever o que sentir vontade, vou postar meus escritos, minhas letras de futuras músicas, boas ou não, bobas ou não, vou me expor e tentar esquecer que os outros vão julgar (por favor) o que virem. Será o meu exercício pra tentar um dia saborear minhas uvas. Pra começar.
* Créditos das músicas citadas: "Tudo ou Nada" - Itamar Assumpção e Alice Ruiz; "Benditas" - Mart´nália e Zélia Duncan; "Chega Disso" - Alzira Espíndola e Arruda. Todas do CD "Pré Pós Tudo Bossa Band", da Zélia Duncan, com exceção da última, apenas no DVD de mesmo nome.